segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Expectativas Enfastiosas


Aconteceu este fim-de-semana em Barcelona uma avalanche de novidades no Mobile World Congress, feira internacional de telemóveis, com o anúncio do lançamento de grandes novidades tecnológicas que vão muito além do simples acto de comunicar telefonicamente e que nos deixam desde já com os olhos em bico. As notícias dão conta de avanços que vão desde ecrãs touch com ícones a três dimensões à possibilidade de captura de imagens a 12 megapixéis.

Também o Jacinto do Eça, suspirava em pleno séc. XIX, pelas últimas novidades da Mecânica e a elas se rendia sem reservas. Uma máquina de abotoar ceroulas era apenas um das muitas maravilhas com que estava equipado o palacete dos Campos Elísios, n.º 202. E no entanto, “pobre Príncipe da Grã-Ventura, tombado para o sofá da inércia…em que lodoso fastio caíra.”

Passadas que foram tantas descobertas, tanta maquinaria nova, tanta tecnologia dada à luz, tanta informática revolucionária, será que nos enfastiamos menos? Ou mais?

Difícil será dizê-lo com todas as letras. Evidente porém é que todos os dias nos são sugeridas novas necessidades e não só passivamente as integramos, como delas nos tornamos facilmente dependentes.

Talvez por isso andemos todos tão meditabundos. Mas, tal como acreditava o amigo do Jacinto, Zé Fernandes, uma existência mais temperada não será assim tão complicada de alcançar. Eventualmente, bastará abrir janelas e não depositar tanta expectativa na parafernália electrónica que nos servem de bandeja como se da melhor coisa do mundo se tratasse.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Mulheres

"Sim, meu caro, as mulheres são um eixo sobre o qual tudo gira."
                             Lev Tolstoi – Anna Karenina

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

O Abutre

Não é fácil conservarmos a noção exacta da realidade. Todos os dias e das mais variadas formas somos injectados com doses maciças de surrealismo que nos dão como adquirido coisas como um Portugal tecnologicamente evoluído, em que até as criancinhas computam; solidariamente forte, em que até aos velhinhos são oferecidos telemóveis para contactos de urgência; e infra-estruturalmente desenvolvido, com pontes que são exemplos de engenharia e TGV aí ao virar da esquina.
A natureza dos acontecimentos quotidianos resiste, contudo, às rasteiras matreiras da retórica e a cada passo, qual lufada de ar fresco, os mais variados episódios deixam-nos com os pés bem assentes no chão. É aí que nos deparámos com Portugal na sua verdadeira dimensão. Um país célere a cobrar impostos aos contribuintes, mas marimbando-se puramente e simplesmente para os problemas e apertos das pessoas concretas, a não ser para aquelas que, tendo tempo, sejam turronas e estejam dispostas a prescindir de boa parte da sua dignidade, pedinchem dias e horas a fio nas intermináveis filas das burocracias nacionais.
Como a dona Augusta Duarte Martinho, pobre coitada, não pôde dar de si para reclamar dignidade e defender os seus pertences, o Estado Social, para quem se calhar descontou toda a vida, pura e simplesmente não quis saber. Morta no chão da cozinha há nove anos, foi preciso entrar em campo o Estado Fiscal que, sem que ninguém o chamasse, esse sim funcionou na perfeição, cobrando-lhe as suas inevitáveis dívidas ao fisco com o leilão da sua habitação, numa imagem perfeita do necrófago abutre.
Num ápice, ficámos a perceber por que é que a página da internet do Ministério das Finanças funciona na perfeição, enquanto a sua congénere do Ministério da Segurança Social é bem mais limitada. Por que é que não existem filas à porta das finanças, enquanto que na segurança social são precisas injecções de paciência para as pessoas serem atendidas. Por que razão numa os prazos não falham, e noutra não existem .
Bem vindos à terra!

Amanhã, 17-02-2011, no Cidade Hoje Jornal

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Quotidiano

"Alguns queixam-se da monotomia, são marcas da adolescência, as pessoas sensatas abominam acontecimentos"


Halldór Laxness - "Gente Independente

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Yann Tiersen - Dust Lane

Yann Tiersen regressa a Portugal em Maio para dois concertos em Lisboa e no Porto, onde apresentará o seu último trabalho "Dust Lane". Depois de dois memoráveis concertos em Famalicão, 2007 e 2009, o autor de "Amélie" não marca desta vez passagem pela Casa das Artes.  Regressemos nós a ele muitas vezes que vale a pena.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Sem Contemplações

Há uns anos, quando percorria diariamente o então IP5, que ligava Aveiro a Vilar Formoso, foi instituída a tolerância zero aos automobilistas. A coisa não foi fácil para quem ali andava no quotidiano, mas foi imediatamente constatável um aumento de civismo por parte dos condutores. A até aí conhecida como estrada da morte conheceu nessora uma diminuição acentuada da sinistralidade da via. Fez-se jus ao ditado popular que aconselha grandes remédios para grandes males. A terapia doeu a muita gente – eu próprio levei com duas multas por circular a setenta e poucos quilómetros/hora onde o limite era de sessenta – mas os seus efeitos não se fizeram esperar. Vem o episódio a propósito para lembrar que, alturas há em que o caminho do diálogo e da sensibilização está notoriamente esgotado Quando assim é, resta passar à fase seguinte.
É isso que é preciso fazer urgentemente em Vila Nova de Famalicão no que ao estacionamento irregular e abusivo diz respeito. As pessoas, não todas mas muitas, perderam a vergonha e com o maior descaramento estacionam onde muito bem lhes dá na real gana, complicando sobremaneira o tráfego citadino, enquanto passam às novas gerações uma imagem de absoluto relativismo quanto às mais elementares regras básicas de cidadania.
Entre muitos, o exemplo mais flagrante do que refiro acontece todos os dias e praticamente a todas as horas na Rua Adriano Pinto Basto, entre os cruzamentos com a Rua Camilo Castelo Branco e a Av. 25 de Abril – ali junto ao antigo Régulo. Como se sabe a artéria em questão é de dupla via, possibilitando a utilização do corredor da esquerda para quem deseja seguir em direcção à rotunda Bernardino Machado e o da direita para quem tenciona seguir em frente ou virar para os lados da estação. Tal é contudo apenas teoria, pois na prática apenas a faixa da esquerda escoa o trânsito, enquanto a da direita está praticamente em permanência obstruída por viaturas paradas, cujos proprietários se percebe com facilidade estarem confortavelmente instalados na pastelaria ao lado ou nas lojas comerciais em frente.
Pior que a limitação ao trânsito, ainda é o desaforo com que a coisa é feita. São ares de absoluta naturalidade e pretensiosa superioridade que são dirigidos a quem desespera nas filas do trânsito. São lições de anti-cidadania que as novas gerações sorvem como pesudo-afirmações de superioridade, matéria em que de resto são já mais do que doutores.
Resta pois passar à fase seguinte, até porque sabemos muito bem onde estacionar o carro quando nos dirigimos ao Porto ou a Braga. É pois mais do que tempo de dar por encerrado o caminho do diálogo e da compreensão. A presente e futura qualidade de vida de uma cidade também passa por aqui.

Publicado no Cidade Hoje Jornal em 10-02-2011

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Do Nome e da Falta Dele


Ter um nome não será tudo, mas que é parte integrante e crucial das nossas vidas, lá isso é! Tanto, que a partir de determinada altura não conseguimos imaginar como é que poderíamos ser identificados de outra forma. Parece que nascemos para ser Agostinho, ou Luísa, ou Simão, ou Ana, ou Manuel, ou Madalena, ou por aí fora. É o que identifica, individualiza e faz perdurar a nossa marca para além da vida. Atribuí-lo é um acto de amor, que personaliza e distingue para sempre.
As instituições são como as pessoas – também precisam de um nome, que as diferencie umas das outras, que afirme a especificidade da sua acção, que as contextualize face ao ambiente geográfico e social em que estão inseridas, que registe os seus passos. Aliás, o próprio nome é um conceito constitutivo e explicativo da sua História, porquanto a sua escolha é sempre reflexo da origem e princípios que a criam.
Estaremos todos de acordo que, apesar dos objectivos similares, o Centro Social da Paróquia de Esmeriz é diferente do Centro Social da Paróquia de Castelões, a Fundação Cupertino de Miranda tem um trabalho e historial totalmente diferentes da Fundação Castro Alves, assim como o Futebol Clube de Famalicão o tem do Grupo Desportivo de Joane e a Escola Camilo Castelo Branco da Escola D. Sancho I, etc..etc…etc... 
Negar um nome que individualize uma pessoa ou instituição é remetê-los para a esfera do anonimato e do indiferenciado. Ninguém merece tal sentença, sobretudo quando a existência de que falamos merece respeito e consideração.
É o caso do Hospital de Vila Nova de Famalicão, cuja origem remonta a 1870 no até então Albergue dos Caminhantes, à Rua Direita, obra e graça da Associação das Filhas de Maria, que, segundo nos conta Vasco César Carvalho (Aspectos de Vila Nova – O Hospital de S. João de Deus), “como anjos da caridade, começaram percorrendo o caminho agro de pedir esmolas, até que abriram o Hospital sob invocação de S. João de Deus”. “Do nada se tornou grandioso pelo rumo esforçante de tantos, pelo auxílio remunerador de mil vontades concorrentes em benefício do bem dos pobres.”, explica-nos o mesmo historiador.
A nobreza da obra, sob invocação do Santo Padroeiro dos Hospitais, Enfermos e Enfermeiros, fica bem patente na deliciosa descrição que Vasco de Carvalho faz sobre os meios com que o Hospital começou a receber doentes: “Três camas, uma insignificância de roupas e de móveis ou por assim dizer nada-de-nada, no fundo aquele começo posto com alma e coração que tantas vezes representa o rasgo para atingir obras de maior alcance social.”
É este legado que o nome da instituição invoca. Ou antes, invocava!
Agora, através das metálicas letras luminosas colocadas na entrada principal do Hospital de Famalicão, sabemos que estamos perante o Centro Hospitalar do Médio Ave E.P.E.
Não sei dizer taxativamente se em termos futuros esta realidade é boa, má, ou apenas indiferente. Mas que no presente é triste, é.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Notícias com Falta de Ar

Um homem de 51 anos desapareceu em Requião sem razão aparente. O episódio está a intrigar família, amigos e vizinhança há cerca de duas semanas, dada a natureza calma e aparentemente pouco aventureira da pessoa em questão. O assunto está a ser acompanhado pelas entidades competentes e já foi alvo de várias buscas em torno da residência do homem. Entretanto, a família já distribuiu vários cartazes em locais públicos com a foto da pessoa a pedir pistas a quem as tiver. É daquelas notícias que, ao contrário de tantas outras, deveria ser merecedora da maior atenção e divulgação da comunicação social local, quer pela actualidade do assunto (desaparecimento de pessoa pacífica, em contexto geográfico calmo e sem razões plausíveis aparentes), quer pela dimensão ética do mesmo, que deveria remeter automaticamente para uma forte divulgação de forma a serem aumentadas as hipóteses de serem encontradas quaisquer pistas sobre o paradeiro da pessoa. E o que fazem os jornais locais? O Povo Famalicense desconhece o problema. O Cidade Hoje idem, aspas, aspas. O Opinião Pública remete-o para uma das suas últimas páginas, sem desenvolvimento e qualquer ilustração. O Jornal de Famalicão também não sabe o que se passa. Assim vai a imprensa deste concelho, à espera que a comunicação social nacional pegue no assunto para depois fazerem manchetes. É jornalismo de quatro paredes e um computador, que não descortina as angústias e inquietudes que vão cá fora, por mais visíveis que elas sejam. Pena é que assim seja e que assim não seja convenientemente cumprida uma das missões maiores do jornalismo: o serviço público.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Interesses em Ascensão


Foto: António Freitas
 A solidariedade deveria ser um ponto de honra entre as instituições públicas que directa ou indirectamente funcionam com base nas escolhas que o povo faz quando vota. Não só pela legitimidade lhes advir da mesma fonte e portanto lhes dever merecer o maior respeito, mas também pela própria saúde do sistema que sustenta o governo do país: a democracia. É que esta, já se sabe, não garante por si só uma sociedade justa, forte e equilibrada. É preciso que os seus maiores executantes, os políticos, ajam no respeito pelos seus princípios e valores.
Não se compreende por isso que o Governador Civil de Braga tenha escolhido as sacristias das igrejas paroquiais para entrega de umas braçadeiras reflectoras de sinalização para peões. É algo de profundamente estranho, que uma entidade que representa o governo da nação no distrito, ignore o primeiro pilar da democracia que são as juntas de freguesia e peça apoio ao Sr. Arcebispo de Braga para a distribuição das ditas braçadeiras através dos párocos da diocese.
Mais estranho ainda é a operação, quando recordámos que é precisamente o governo que nomeou o Sr. Governador Civil que tem como ponto de honra o respeito absoluto pela Lei da Liberdade Religiosa, segundo a qual o Estado Português respeita o princípio da não confessionalidade, não adoptando qualquer religião, nem se pronunciando sobre questões religiosas.
Da teoria à prática vai contudo uma grande distância. Uma coisa são os discursos inflamados de boa vontade e outra, bem diferente, é a realidade. E nessa, as pessoas têm os seus interesses, tantas vezes inconfessados, mas quase sempre conscientemente condicionantes. Por eles se atropelam princípios e se subvertem valores; por eles se fazem vãs as palavras e ocos os discursos; por eles, como amargamente temos sentido, se pode perder um país.

Publicado no Cidade Hoje Jornal em 03-02-2011

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Felicidade

Foto JA - Parque da Cidade - Porto

"Isto é na verdade a essência da felicidade:
Poder esperar ansioso pela chegada do dia de amanhã."
                                                                                          
                                                                                        Gente Independente - Halldór Laxness