domingo, 5 de junho de 2011

Novos Passos

O futuro tratará de confirmar se esta foi realmente a "Hora H". Vamos acreditar que sim, sem grandes entusiasmos que cautela e caldo de galinha nunca fez mal a ninguém.
Espera-se sobretudo uma nova forma de governar o país. Menos fulestrias e mais substância é no fundo o que todos desejamos e o que o país precisa. De Sócrates fica-nos a visibilidade dos erros, que à falta de outra utilidade devem pelo menos desviar Passos para outros caminhos, outras teorias, outros respeitos.

sábado, 4 de junho de 2011

Vida

Foto JA



"Bem se diz que é necessário tempo para chegar a conhecer as criaturas e que neste tráfego da vida nada é coisa assente."

Sancho Pança a D. Quixote de la Mancha
Cervantes
                                                                                         

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Hora H

Compreendo todas as dúvidas em relação às eleições do próximo domingo menos uma: em quem não votar!
Pela sua natureza, o cargo de primeiro-ministro deveria estar reservado a quem reunisse um conjunto alargado de qualidades e virtudes pessoais óbvias, como a honestidade, a integridade, a capacidade de liderança e de execução e o sentido de estado, entre algumas outras, que, no seu conjunto, limitariam drasticamente o acesso ao cargo a uma meia dúzia de indivíduos. Os tempos são contudo de relativismo e o mais importante cargo da nação, como de resto muitos outros, abre-se em função do exercício partidário, que estabelece critérios bem mais alargados e naturalmente discutíveis. A história recente diz-nos que esse é um mau caminho, mas é o contexto que temos. Em todo o caso, há o mínimo dos mínimos e esses não devemos deixar de exigir a quem ocupa o mais importante cargo da nação, quanto mais não seja pelo decoro que devemos a nós próprios.
Pois Sócrates não cumpriu com os mínimos. Diz e desdiz-se ao sabor das confrontações da comunicação social, pensa e age ao sabor do momento e da estratégia que elenca para sobreviver no poder, sacode a água do capote com uma sobranceria que impressiona, culpabiliza meio mundo pelo desastre nacional e ao fim de seis anos de primeiro-ministro não assume qualquer responsabilidade pelo atoleiro em que está metido o país.
Não, o homem não reúne as mínimas condições para voltar a assumir a liderança governamental. Num país com exigências democráticas levadas a sério, José Sócrates já não era sequer candidato, pois seriam os seus pares os primeiros a reorientar internamente estratégias em função dos princípios que estiveram na base da criação do partido: “uma sociedade mais livre, mais justa, mais solidária, mais pacífica, através do aperfeiçoamento constante e do desenvolvimento harmonioso da democracia”.
Não sendo por aí, a reação aos últimos anos de governação terá que ser dada no próximo domingo. E mais do que gritos geracionais, greves gerais, e outros ais, é nas urnas que a revolta se deve fazer sentir, sob pena de grave incoerência coletiva que, diabo seja surdo, a verificar-se confirmaria um buraco mental nos portugueses de dimensões bem mais preocupantes que o buraco financeiro.

Hoje, 02-06-2011, no Cidade Hoje Jornal

segunda-feira, 30 de maio de 2011

HISTÓRIAS SIMPLES

Se é certo que o avanço científico e tecnológico veio revolucionar o mundo, também é verdadeiro que, ao contrário do que seria de prever, a vida tem vindo a complicar-se gradualmente. Claro que é extremamente confortável escrever estas linhas no teclado de um computador que apaga os erros sem deles deixar rasto, enquanto ainda nos sugere alternativas ortográficas. Ou aproveitar a mesma ferramenta para conhecer o mundo e o que nele se passa!. Não menos real contudo, é que a simplicidade da vida tem vindo a evaporar-se gradualmente. Recebi há dias uma apresentação informática bem demonstrativa disso mesmo. Através dela, recordava-se o tempo, relativamente recente de resto, em que um aluno poderia naturalmente chumbar sem que isso implicasse um passaporte imediato para a psicologia. Em que a malta lá do bairro bebia água do poço sem se preocupar minimamente com o seu grau de pureza, depois de uns sprints de bicicleta sem capacete, joelheiras e afins. Os pais não tinham o mínimo controlo sobre as brincadeiras dos filhos. Dentes, braços e pernas partidas era consequência natural dos excessos e não culpa do piso da estrada, do muro do vizinho ou da tabela do campo de jogos da associação lá da terra. Enquanto isso, o mundo dos adultos prescindia das muralhas que, cada vez mais, envolvem as habitações, das câmaras de vigilância e das sessões de terapia colectiva, que mais não fazem do que compensar a falta de amigos e de relações interpessoais. A vida era bem mais simples, mas, quer-me parecer, bem mais feliz! Depressão era conceito desconhecido. Ansiedade Generalizada, Fobia Social, Transtorno obsessivo-compulsivo, idem aspas aspas. Sim, a média de vida aumentou, vivemos mais anos. Mas isso não significa que a desfrutemos mais do que antigamente ou, pelo menos isso seria de esperar, que estejamos a salvaguardar a possibilidade de as novas gerações o fazerem.
Como afirmou Edgar Morin, sociólogo e pensador francês contemporâneo, “Estamos a perder a promessa do progresso”. Seria naturalmente espectável que os avanços científicos e tecnológicos conduzissem o Homem a um crescente desfrute da vida e da humanidade. Paradoxalmente, quem ganha terreno é o isolamento e as psicoses. Consequentemente, crescem as assimetrias, as tensões sociais e os conflitos.
O mundo está a complicar-se. Já não existem histórias simples.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Pelo andar do Caranguejo

Sou daquela geração que sente inegável dificuldade em orgulhar-se da sua portugalidade. Bem nos podem dizer que somos uma das mais velhas nações do mundo, que a nossa língua é falada em cinco continentes, que abrimos novos mundos ao mundo, que fomos os primeiros a abolir a pena de morte, que dividimos o mundo em dois e que descobrimos a via verde, a verdade é que sentiremos sempre muitas reticências em pularmos de contentamento pela nossa lusa condição.
Nascemos com a alvorada de abril e com os ares da anunciada liberdade acreditámos num país desenvolvido e próspero. Entretanto, abriram-nos as portas das universidades, falara-nos em formações e especializações e acenaram-nos como uma Europa rica, solidária e fraterna. Assistimos a tudo. As TV’s coloriram-se, os computadores apareceram, a internet invadiu as nossas vidas, os cd’s deram cabo das K7 e tantas, tantas outras maravilhas. O mundo aproximou-se, literalmente. O que era distante ficou perto, o que era lento ficou rápido, o que era rude ficou estético.
E enquanto durava todo este edílico não fomos capazes de perceber que quem crescia realmente e de forma sustentada era o vizinho do lado, além-fronteiras. Fomos todos na onda do entusiasmo. Cidadãos que se endividaram. Governantes que administraram mal. Políticos que se enredaram no corporativismo. Juízes que não julgaram. Professores que não ensinaram.
Hoje estamos onde estamos. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, o nosso país está na eminência de registar a maior quebra do poder de compra dos últimos 27 anos. Não, não é culpa da contingência internacional. É culpa nossa e das ilusões que nos cegaram. Em 2012, Portugal arrisca-se a ser o único país no mundo em recessão. É verdade que muitos tiveram a sua crise, enquanto outros a continuam a ter, mas nós andámos nisto há demasiado tempo. O pântano já vem de longe. Sim, há muitos anos que a minha geração tem carreiras congeladas, sonhos desfeitos, promessas adiadas, futuros ameaçados.
Desculpem, mas não, não me entusiasmo!

Amanhã, 19-05-2011, no Cidade Hoje Jornal

quarta-feira, 11 de maio de 2011

O insano, o fúnebre e os imbecis


O Grito de Munch
  
O homem é um artista. E para além de artista é vesano. Às primeiras palavras que José Sócrates debitou no passado dia 3 de Maio, quando era suposto anunciar o pacote de austeridade sugerido pela dita troika, já o delírio era uma evidência. Não vai acontecer isto, não vai acontecer aquilo, e também não vai acontecer aqueloutro. Do que vai realmente acontecer, e que seria supostamente o motivo do direto e televisivo comunicado ao país, nem uma palavra. Tudo em paz. Tudo tranquilo. Só desafogos portanto. Alívio em cima de alívio. Elucidativo só mesmo o ar de velório do reaparecido ministro Teixeira dos Santos.
No dia seguinte, já sem os devaneios e exaltações do primeiro-ministro a entrar-nos porta dentro, a dura realidade começa a chegar-nos aos poucos: vem aí mais impostos, menos prestações sociais, o gás e a luz vão aumentar, os desempregados vão pagar IRS, os despedimentos vão ser facilitados, etc. etc... De uma maneira ou de outra, ninguém fica de fora e todos vão sofrer ainda mais duramente as consequências da incompetência com que fomos governados nos últimos anos.
Como é que o homem mantém tão altas intenções de voto? Essa é uma parte difícil de explicar. Não porque não saibamos a resposta, que sabemos, mas porque nos é demasiado custoso exprimi-la, confessá-la. E para não ficar eu com o ónus da coisa, socorro-me de Guerra Junqueiro e das suas conhecidas e esclarecedoras palavras escritas no “Pátria”, em 1896, a propósito dos portugueses: 'Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas...'
Amanhã, 12-05-2011, no Cidade Hoje Jornal

quarta-feira, 9 de março de 2011

Inócuos Episódios

Na década de 80 do século passado, o então Presidente da República, Mário Soares, avançou com o programa “Presidência Aberta”, para “auscultação das populações e das forças mais vivas de cada região". A moda pegou e, salvo pequenas variações de nome, é hoje uma tradição na política nacional. Jorge Sampaio, por exemplo, avançou com as “Jornadas da Presidência”, Cavaco, chama-lhe “Roteiros” e Sócrates opta por “Governo Presente”. Se a ideia até poderia ser boa, a forma como é executada transformam-na numa perfeita inutilidade. É que percebe-se com facilidade que não é coisíssima nenhuma a auscultação das populações que está em causa, mas antes o pavoneamento dos governantes à populaça da província que, já se sabe, é todo o Portugal excepto Lisboa.
Veja-se o caso recente do primeiro ministro de Portugal que dedicou um fim de semana à região de Trás-os-Montes, naquela que foi a primeira iniciativa do “Governo Presente” de 2011. José Sócrates e séquito correspondente foram recebidos com as mordomias da praxe, pois a hospitalidade é ponto de honra da lusa gente. Contudo, entre lançamentos de primeiras pedras, visitas a obras e inaugurações, saltou-se de festa em festa, de alegria em alegria, sem que houvesse verdadeira disposição para se ouvir além do som do rancho folclórico local ou das crianças da creche do centro social. Entre tanto ruído festivo, sempre fica por conhecer o som da amargura de quem tem que recorrer a serviços públicos que não funcionam, funcionam mal, ou que pura e simplesmente estão em vias de extinção. Não há espaço para, in loco, se perceber o porquê do tanto desânimo que afecta o nosso povo, quiçá pelo conforto de se manter longe do coração aquilo qua a vista desarmada não permitiria.
Quando confrontado com estes inócuos episódios, sempre me vem à memória o Papa Kiril Lakota que Morris West criou em “As Sandálias do Pescador” e que, num humilde momento de lucidez, despe as vestes papais e pela calada da noite passeia-se incógnito pela cidade, absorvendo a realidade tal como ela de facto era e não como até ele lhe chegava.
 A mensagem vem do século passado - o livro foi publicado em 1963 - mas a sua actualidade deveria estar bem presente na mente de todos aqueles que, por força das circunstâncias, têm responsabilidades na gestão do erário público e que honestamente se interessem pela qualidade de vida das populações. Quanto aos outros, mais valia que não saíssem da capital. Sempre se poupava dinheiro.

Amanhã, 10-03-2011, no Cidade Hoje Jornal