quarta-feira, 18 de maio de 2011

Pelo andar do Caranguejo

Sou daquela geração que sente inegável dificuldade em orgulhar-se da sua portugalidade. Bem nos podem dizer que somos uma das mais velhas nações do mundo, que a nossa língua é falada em cinco continentes, que abrimos novos mundos ao mundo, que fomos os primeiros a abolir a pena de morte, que dividimos o mundo em dois e que descobrimos a via verde, a verdade é que sentiremos sempre muitas reticências em pularmos de contentamento pela nossa lusa condição.
Nascemos com a alvorada de abril e com os ares da anunciada liberdade acreditámos num país desenvolvido e próspero. Entretanto, abriram-nos as portas das universidades, falara-nos em formações e especializações e acenaram-nos como uma Europa rica, solidária e fraterna. Assistimos a tudo. As TV’s coloriram-se, os computadores apareceram, a internet invadiu as nossas vidas, os cd’s deram cabo das K7 e tantas, tantas outras maravilhas. O mundo aproximou-se, literalmente. O que era distante ficou perto, o que era lento ficou rápido, o que era rude ficou estético.
E enquanto durava todo este edílico não fomos capazes de perceber que quem crescia realmente e de forma sustentada era o vizinho do lado, além-fronteiras. Fomos todos na onda do entusiasmo. Cidadãos que se endividaram. Governantes que administraram mal. Políticos que se enredaram no corporativismo. Juízes que não julgaram. Professores que não ensinaram.
Hoje estamos onde estamos. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, o nosso país está na eminência de registar a maior quebra do poder de compra dos últimos 27 anos. Não, não é culpa da contingência internacional. É culpa nossa e das ilusões que nos cegaram. Em 2012, Portugal arrisca-se a ser o único país no mundo em recessão. É verdade que muitos tiveram a sua crise, enquanto outros a continuam a ter, mas nós andámos nisto há demasiado tempo. O pântano já vem de longe. Sim, há muitos anos que a minha geração tem carreiras congeladas, sonhos desfeitos, promessas adiadas, futuros ameaçados.
Desculpem, mas não, não me entusiasmo!

Amanhã, 19-05-2011, no Cidade Hoje Jornal

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